segunda-feira, 18 de maio de 2020

Desafio de escrita criativa: O Cão - por Fabi Sanchez

Olá, queridos leitores!

Vamos a mais um desafio de escrita criativa?
Esta semana o tema é bem legal, eu, particularmente, adoro. A ideia é a de usar elementos de fantasia no texto. Na verdade, esse desafio me veio bem a calhar, pois meu próximo projeto de escrita está relacionado com as narrativas fantásticas brasileiras, mas não vou dizer mais para deixá-los na expectativa, por enquanto vamos com o texto desafio da semana. A crônica a seguir vai ser considerada por vocês, um texto fantástico, mas saibam, é totalmente baseada em fatos reais.

Papel de parede : noite, estrada, tarde, cachorro, fique, Cães ...



O cão

 Era sexta-feria à noite, fim de uma semana e tanto. Nossos grandes amigos haviam se mudado para um outro estado e deixado o sítio para trás. Ficamos combinados de morarmos em sua casa e cuidarmos dela como sendo nossa. Toda mudança traz um desgaste físico e mental enorme. Eu e meu marido estávamos exaustos, pois fizemos toda a mudança na unha, sem caminhão, atravessando a cidade por diversas viagens de carro. 
Esta era a última delas. 
No carro trazíamos apenas nossas últimas plantas, seiva de vida verde que tanto nos são caras. Bom, isso não quer dizer que não gostemos de nossos animais, ao contrário, o amor que temos por nossos gatos e cachorros é tão grande quanto o que temos por nossas plantas. Seja verde ou vermelho, o sangue pulsante de amor é força vital em nossa família. Acredito que nossas pimenteiras, por muitas vezes, deram suas vidas para protegerem a nós. Por quantas vezes nossa gata mais velha não deitou-se, de muito bom grado, sobre um joelho dolorido ou um coração partido dando-nos cura ou revitalizando uma energia consumida? E por quantas vezes, com aquele olhar doce de chocolate, nossa cachorra não se deitou sobre nossos pés mostrando-nos de que nunca estaríamos sós? 
Cachorros são protetores por instinto, disso todos nós sabemos.
Com a casa, ganhamos a companhia do Barão, um pastor de Malinois enorme, com olhar atravessado de desconfiança, rosnava com as pupilas, sem soltar um único latido, duro e teimoso como um lobo indomesticável. Ao chegarmos, o cão estava tristonho, pensávamos que o perderíamos, de tanta infelicidade que havia em seu coração pela falta dos donos anteriores, mas quando trouxemos a Cacau, ele se reanimou. Cacau tornou-se a mentora da fera e mais uma vez ela mostrava que a companhia era sua melhor qualidade.
Naquela noite fria de junho, a neblina estava baixa, úmida e congelante. As ruas desertas e as poucas portas das raras casas pela estrada de terra fechadas. Conversávamos sobre nosso cansaço observando a escuridão da noite sem lua e concluindo que o fim de um ciclo antigo estava dando-se naquele momento. O carro cheirava a mato, a estrada cheirava a pó úmido. Eram novos cheiros aos quais teríamos que nos adaptar: cheiro de mato, cheiro de escuridão, cheiro de neblina, cheiro de um novo caminho. Entre as palavras de observação, carregávamos palavras de reza em nossos corações, pedido que o orixá do caminho, o cão protetor de todas as ruas, abençoasse esse nova jornada que estávamos tomando.
Passávamos pela última pequena colina antes de descermos a rua do sítio, mal enxergávamos a estrada graças a forte névoa que dançava com as luzes do farol do carro. 
Do terreno acima do nosso, um antes de chegarmos, vimos a Cacau descendo pelo mato, saltitante e alegre como sempre, vindo nos recepcionar.
-Olha lá, amor, a Cacau já está super adaptada, vem descendo para nos receber.
-Owwnn, que linda a Cacau. Mas ela é fogo, né, adora uma rua!
E ao dizer a última palavra, percebemos que não era a Cacau, era um cão mais escuro, na verdade, bem mais escuro.
-É o Barão!
Quando chegou à margem da rua, o cão cor de neblina olhou para o carro e seus olhos refletiram a luz vermelha de seiva de sangue. Ele continuou descendo lentamente em direção à rua, e cada passada que dava o animal se fundia com a neblina. Aumentei o farol para distinguí-lo, e foi aí que, bem na  nossa frente, ele desapareceu, virou névoa. Passei com o carro bem por onde o cão não estava mais.
Não falamos nada um para outro. 
Entramos no sítio. A Cacau dormia pesadamente na varanda ao lado do Barão. E só após esta constatação, meu marido me perguntou:
- Você viu o mesmo que eu, ou estou ficando louco?
E eu o respondi:
- Ogun nos abençoou, querido!

Gostaram? Aguardem meu próximo livro, pois tem muito mais ficção real de onde veio essa!
Bjks e Boas Leituras!


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